A realização de um loteamento demanda diversos cuidados, de modo a proporcionar segurança jurídica e minimizar os possíveis problemas. Portanto, se faz necessária uma análise minuciosa das legislações correlatas ao empreendimento, para verificar o que deve e o que não deve ser feito.
A Lei de Parcelamento do Solo (lei 6.766/79), elenca nos artigos 50 ao 52 diferentes hipóteses de crimes que envolvam loteamentos e desmembramentos. Contudo, o presente artigo visa tratar especificamente do crime descrito artigo 50, conforme a seguir descrito:
Art. 50. Constitui crime contra a Administração Pública.
I – dar início, de qualquer modo, ou efetuar loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos, sem autorização do órgão público competente, ou em desacordo com as disposições desta Lei ou das normas pertinentes do Distrito Federal, Estados e Municipíos;
II – dar início, de qualquer modo, ou efetuar loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos sem observância das determinações constantes do ato administrativo de licença;
III – fazer ou veicular em proposta, contrato, prospecto ou comunicação ao público ou a interessados, afirmação falsa sobre a legalidade de loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos, ou ocultar fraudulentamente fato a ele relativo.Pena: Reclusão, de 1(um) a 4 (quatro) anos, e multa de 5 (cinco) a 50 (cinqüenta) vezes o maior salário mínimo vigente no País.
Parágrafo único – O crime definido neste artigo é qualificado, se cometido.
I – por meio de venda, promessa de venda, reserva de lote ou quaisquer outros instrumentos que manifestem a intenção de vender lote em loteamento ou desmembramento não registrado no Registro de Imóveis competente.
Além disso, a mencionada lei dispõe no seu artigo 37 que “É vedado vender ou prometer vender parcela de loteamento ou desmembramento não registrado”. Sendo assim, para que seja possível vender o produto dos procedimentos de parcelamento do solo, será necessário percorrer alguns caminhos antes da comercialização.
CAMINHOS PRÉVIOS A COMERCIALIZAÇÃO DOS LOTES
- Estudos de Viabilidade: Geralmente esse tipo de empreendimento é precedido dos estudos de viabilidade, de modo a proporcionar segurança para os investidores deste ramo. Ele é composto da viabilidade legal, viabilidade ambiental, viabilidade urbanística, viabilidade financeira e viabilidade comercial;
- Elaboração dos projetos: Nesta etapa são elaborados todos os projetos integrantes do procedimento, como o projeto urbanístico, projeto das infraestruturas (drenagem, terraplanagem, abastecimento de água, elétrico, pavimentação, ambientais, entre outros);
- Aprovação dos projetos: Essas aprovações ocorrem na prefeitura do município em que se localiza o imóvel, no órgão ambiental pertinente e nas concessionárias de água e energia, por exemplo;
- Registro imobiliário: Após os caminhos mencionados acima, chega-se à parte final que é o registro imobiliário, onde serão apresentados todos os projetos aprovados, com as devidas licenças e demais certidões constantes no artigo 18 da Lei de Parcelamento do Solo (lei 6.766/79).
Após esse caminho é que será possível iniciar a comercialização dos novos imóveis originados.
Nesse momento você pode estar se perguntando: Mas e as obras de infraestrutura, não é necessário estarem finalizadas para iniciar a venda dos lotes?
E a resposta é, DEPENDE!
Se o loteador percorrer todo o caminho mencionado e fornecer uma garantia ao município para execução das obras em um determinado tempo, ele poderá efetuar o registro imobiliário e começar as vendas. Claro que será obrigatória uma averbação na matrícula dos imóveis mencionando que as obras de infraestrutura ainda estão em execução, limitando a edificação nos imóveis até a conclusão de todas as obras.
Contudo, se o loteador não quiser fornecer uma garantia na execução das obras de infraestrutura, deverá realizá-la por completo, para depois conseguir o registro imobiliário e iniciar a comercialização dos lotes.
Independente do momento da realização das obras de infraestrutura, a venda dos lotes apenas poderá ser iniciada, após a realização do registro do loteamento.
Nesse sentido há diversas jurisprudências onde demonstra o acolhimento da denúncia oferecida pelo Ministério Público, condenando os infratores nas penas cominadas pela lei, conforme um exemplo a seguir:
LEI 6.766/79. LOTEAMENTOS IRREGULARES. ART. 50, INC. I, E PARÁGRAFO ÚNICO, INCISO I. FRACIONAMENTO PARA FINS URBANOS. EXISTÊNCIA DOS FATOS E AUTORIA.
Loteamentos irregulares, com oferta e venda de terrenos, em área rural, com características de urbanização. Ausência de registro, bem como arruamento e serviços básicos de núcleos urbanos. Autoria induvidosa, a começar pela confissão. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. Basilar fixada no mínimo legal, sem força alegada confissão para romper o mínimo cominado. Tema sumulado. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. Descabimento, pois em caso de concurso de crimes, deve ser levada em conta a soma das penas mínimas cominadas e, mesmo em caso de continuidade, o acréscimo mínimo. CONCURSO DE CRIMES. Sentença que reconheceu a continuidade. Mas o caso é de concurso material, pois loteamentos distintos, com lapso temporal significativo entre ambos. APELO DEFENSIVO IMPROVIDO. APELO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PROVIDO. UNÂNIME. (Apelação Crime N° 70066827593, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ivan Lemar Bruxel, Julgado em 27/07/2017).
Portanto, para configuração do crime é necessário que o agente dê início ao parcelamento do solo colocando em risco a coletividade, bem como demonstrando de maneira inequívoca a sua intenção em vender os lotes sem a devida regularização do parcelamento do solo, conforme a legislação impõe.
Diante de todo o exposto, ainda que estejam cumprindo todos os caminhos para a melhor execução do loteamento, deve-se ter cuidado nas informações e divulgações do empreendimento, visto que conforme exaurido acima, a comercialização somente poderá ser iniciada a partir do registro imobiliário.
